Cannabis na era digital: os obstáculos para a disseminação de informações sobre o tema
Por Maria Eugenia Riscala
Hoje, apesar das redes sociais serem uma ferramenta poderosa para a disseminação de informações referentes a tudo que nos cerca, ainda existem muitas restrições sobre a divulgação de temas como a cannabis. A planta não tem todos os seus usos regulamentados no Brasil e as diretrizes de diversas plataformas digitais dificultam a publicação de pautas referentes ao assunto.
No Brasil, o uso medicinal de cannabis é permitido via importação, segundo a RDC 660, e a partir de produtos que estão disponíveis nas farmácias, regulamentados de acordo com a RDC 327. Há exceções desse consumo por meio das associações de pacientes e dos habeas corpus autorizando o auto cultivo. Esses produtos à base de cannabis, no entanto, ainda são tratados pela lei como medicamentos controlados e, por isso, existem diversas especificações sobre sua divulgação. A RDC 327, por exemplo, aponta que é proibida qualquer publicidade sobre os produtos de cannabis, o que dificulta a presença desses itens nas redes sociais e em qualquer outro canal.
Considerando a possibilidade de compra nas farmácias, os derivados da cannabis deveriam ser entendidos como um medicamento qualquer, como Doril, Coristina e Neosaldina, que ocupam as telas da televisão brasileira, mas ainda são medicamentos controlados, que ficam atrás do balcão e, portanto, precisam de prescrição Além disso, a compra para uso compassivo, como no caso das associações e HCs, é considerada um tipo de terapia no país, e, assim, são consideradas outras regras de propaganda.
No caso das redes sociais, os critérios das comunidades não são explícitos com o que é e o que não é liberado com o termo cannabis, principalmente quando falamos de Instagram e Facebook. Ambas as plataformas derrubam posts e páginas, mesmo aquelas que trazem conteúdo informativo sobre o assunto. Além disso, deixam perfis no “shadow ban“, com o intuito de evitar conteúdos inapropriados e pessoas que infringem a lei tentando, de certa forma, reduzir o mercado ilegal de drogas.
O TikTok, rede que está bombando entre os Gen Z, por sua vez, é bem rígido, já que nada relacionado à cannabis ou qualquer outra substância que seja para fumar e vaporizar, ou seja, fazer fumaça, pode ser publicado. Talvez seja por isso que a maioria dos influencers e páginas educativas sobre cannabis ainda não migraram para a nova rede, o que pode ser prejudicial para os usuários, uma vez que o consumo não deixa de acontecer pela proibição e inibe a possibilidade de um conteúdo educativo.
Já a plataforma do Linkedin vem fortalecendo o segmento e é onde o conteúdo vem ganhando cada vez mais espaço. Apesar de ter um perfil mais focado em um público empresarial, atualmente já se encontram diversos tipos de pessoas na rede que se beneficiam dos conteúdos sendo publicados.
Até que não deixe de haver restrições, as empresas que atuam nesse segmento utilizam alternativas criativas para driblar as proibições impostas pelas plataformas, como o uso de termos com duplo sentido, charges, letras tachadas, sinônimos, entre outros. Apesar desses esforços para manter o conteúdo na mídia, muitas vezes informações importantes são perdidas, lives derrubadas e contas desaparecem. Tudo isso prejudica o usuário da plataforma, que não se beneficia do material criado por influenciadores locais, já que muitas vezes apenas as contas internacionais se mantêm.
Hoje, no entanto, já existem alguns movimentos para fortalecer o tema nas redes no Brasil. Temos como exemplo influenciadores que entraram na justiça para conseguir reativar seus perfis, que foram desativados por conta das restrições nas plataformas. Há, inclusive, uma petição online para melhorar as diretrizes quando o assunto é cannabis.
É essencial batalhar cada vez mais por esses espaços, afinal, as redes sociais são fundamentais para disseminar informações sobre os benefícios da cannabis e desconstruir o preconceito que está em torno do uso da planta, principalmente entre públicos que não buscam outras ferramentas de pesquisa para imergir no tema. O envolvimento da população na discussão do assunto é fundamental para que chegue às autoridades responsáveis pela regulamentação da planta no país, que será vantajosa para diversos segmentos da sociedade, principalmente na saúde e na economia.
Maria Eugenia Riscala é cofundadora e CEO da Kaya Mind, primeira empresa brasileira especializada em dados e inteligência de mercado no segmento da cannabis, do cânhamo e de seus periféricos. Na companhia a executiva atua diretamente no atendimento e prospecção de clientes e parceiros comerciais, além de ser a administradora financeira da operação.
Formada em Relações Internacionais e possui Master em Consumer Insights, Maria Eugenia acumula vasta experiência na área comercial, administrativa e de inteligência de mercado em diferentes segmentos, com passagem em grandes empresas como a P&G, multinacional americana de bens de consumo.