47º Festival de Cinema de Gramado
Lázaro Ramos recebe o Troféu Oscarito nesta noite em Gramado.
Destinado a grandes atores do cinema brasileiro, o Troféu Oscarito da edição de 2019 do Festival de Cinema de Gramado vai homenagear Lázaro Ramos. A cerimônia acontece no Palácio dos Festivais, antes da exibição da segunda sessão da programação. Baiano de Salvador, ele começou sua trajetória pelo Bando de Teatro Olodum, ainda adolescente. Hoje Lázaro contabiliza mais de 30 filmes entre longas e curtas, além de 60 prêmios pelas diferentes nuances artísticas entre cinema, teatro, televisão e literatura.
Seu filme de estreia foi nada menos que “Madame Satã”, dirigido por Karim Aïnouz. Em seguida vieram outros títulos já referenciais do cinema brasileiro, como “Cafundó”, com o qual venceu o Kikito de melhor ator no Festival de Gramado de 2005, “Carandiru”, “O Homem do ano”, “Cidade baixa”, “Ó, pai, ó”, “O homem que copiava”, “Meu tio matou um cara” e “Saneamento básico – o filme”, estes três últimos em parceria com Jorge Furtado, com quem também faz na televisão a série “Mister Brown”.
Além de sua concorrida agenda como ator, escritor, diretor e apresentador, Lázaro Ramos é Embaixador da Unicef desde 2009, cumprindo uma trajetória que evoca paixão pela arte e defesa à cidadania. A coletiva de imprensa com Lázaro Ramos será no mesmo dia da homenagem às 15h no Hotel Colline de France.
A realidade, o sonho e o universo adolescente.
O final da manhã não dispersou a névoa intensa sobre Gramado, e muito menos o público cinéfilo, que lotou o auditório para os debates de hoje no Hotel Serrazul. Seguindo a ordem das exibições da noite de sábado, o primeiro longa discutido foi o equatoriano “A Son of Man – La maldición del tesoro de Atahualpa”, do diretor Jamaicanoproblem. Em seguida, foi a vez de “Raia 4”, filme brasileiro assinado por Emiliano Cunha.
Para começar, o diretor do longa estrangeiro respondeu à pergunta que não quer calar: Jamaicanoproblem – que nome exótico é esse? Luis Felipe Fernandez-Salvador y Campodonico revelou, então, que tinha muita dificuldade em si ver como diretor – e ator – até o momento em que, como em uma epifania, lhe foi revelado que adotar um nome artístico facilitaria a separação das ‘personas’. Seu alterego foi, então, batizado como Jamaicanoproblem, “mas poderia ter sido um outro nome qualquer”, diz, divertido.
Na mesa com a alemã Lily van Ghemen, sua companheira também no elenco, o diretor afirmou ao público que a história contada no filme é totalmente real. Assim como todos os personagens, ele interpreta a si mesmo contando sua história de maneira que a câmera exerça quase o papel de um psicanalista. As situações vão sendo resolvidas ao longo da narrativa de ocorrências reais, mas sempre envolvidas por sonho e fantasia. Para o gênero que classificaria sua obra, Jamaicanoproblem propõe o termo “Realismo Fantástico”. Apesar da inspiração no Realismo Mágico eternizado por Garcia Marquez e outros autores latino-americanos, ele afirma que são duas coisas bem diferentes.
O diretor falou, ainda, sobre as técnicas usadas para a filmagem em áreas de difícil acesso e ainda inexploradas no coração da Amazônia, reveladas em imagens de beleza ímpar e grandiosa. A frase nietzschiana “só como fenômeno estético podem a existência e o mundo justificarem-se eternamente”, dita em três momentos por Lily ao longo do filme, parece resumir o pensamento de Jamaicanoproblem: “não se pode levar a vida tão a sério, é preciso sonhar sempre”, concluiu. Parece que esta é também a opinião de Luis Felipe Fernandez-Salvador y Campodonico.
Já o universo aquoso e azul piscina no qual mergulha a protagonista do longa “Raia 4” ganhou aplausos e muitas interpretações durante o debate realizado na manhã de domingo. Camadas de citações, transição entre o gênero do terror, hit entre os adolescentes, e o drama intimista; a perspectiva do registro da densidade e das transformações do universo tumultuado pela ebulição dos hormônios suscitaram questões, interpretações e abordagens sobre o perfil da protagonista interpretada por Brídia Moni.
Vilã ou mocinha, fato é que a figura da nadadora tem muito da biografia do diretor: Emiliano Cunha foi atleta e competidor de natação dos 8 aos 20 anos. O elenco de 14 adolescente é, igualmente, composto por atletas de natação. Depois da seleção, passaram por três meses de preparação sob orientação da atriz Liane Venturella. Além disso, dada às recorrentes citações das perspectivas freudianas na condução da trama e do desfecho surpreendente, também contou que no ambiente familiar convive com muitas psicólogas.
A fotografia e a direção de arte, que contrastam e delineiam as cenas mesclando tons de azul e vermelho, também viraram alegoria sobre sofrimento, amadurecimento, vida e morte em embate. E afirmaram para Emiliano Cunha a potência de primeiro longa depois a primeira exibição para o público durante o Festival de Gramado. “Foi, sem dúvida, a melhor exibição e a melhor reação até agora. Tudo foi cercado de afeto, senti muita conexão com o público. Senti a transformação das pessoas a partir do que o filme propõe. Foi emocionante ver os pais de muitos dos atores chorarem no final”, avaliou Emiliano Cunha, antecipando que seu primeiro longa começa agora a percorrer festivais internacionais em Cartagena (Colômbia), Xangai (China), Uruguai e Tucumã (Argentina).