A reforma tributária apresentada pelo Governo do Estado tem vários aspectos positivos; exceto em relação à simplificação do ICMS. Conforme anunciado, o objetivo é simplificá-lo mediante a redução de alíquotas. Porém, isso é insuficiente, já que no RS as causas da sua complexidade são outras. Aqui, o problema começa quando o legislador renúncia àquilo que o define: a competência para legislar e se prolifera nas mãos do poder executivo, que passa a fazer o que não lhe compete: legislar por decreto.
Segundo o artigo 150, I, da CF/88, a instituição e o aumento de tributos é matéria reservada à lei. Lei em sentido formal e material, ou seja, além de discutida e aprovada pelos representantes do povo, o seu texto deve ser determinado e específico. Desse modo não se entrega um cheque em branco ao poder executivo, e se confere segurança jurídica aos contribuintes. O problema é que o legislador gaúcho não tem levado isso a sério. Por exemplo, o projeto de reforma apresentado pelo Governo insere uma alínea “c”, ao § 13, do artigo 33, da lei nº 8.820/89, que confere ao Executivo o poder de imputar a qualquer estabelecimento a condição de substituto tributário, impondo-lhe a obrigação de recolher antecipadamente o ICMS devido por outro contribuinte situado na cadeia de circulação. Isso, não obstante o STF já ter decidido que a imposição de responsabilidade tributário é matéria reservada à lei. Essa é uma prática institucionalizada. São inúmeros os artigos da lei estadual nº 8.820/89, Lei do ICMS, que concedem esses cheques em branco ao poder executivo outorgando-lhe a competência para legislar por decreto, definindo fatos e as condições que o contribuinte deve cumprir. Os casos são tantos que quem lê a lei do ICMS fica com a impressão de que o decreto estadual que regulamenta o imposto é hierarquicamente superior a ela. São esses retalhos e emaranhados que tornam o nosso ICMS tão complexo. A reforma proposta não toca nesse tema e sem enfrentá-lo não terremos simplificação.
O parlamento gaúcho deve considerar que a competência legislativa sobre as matérias arroladas nos artigos 150, § 6º, da CF/88 e 97, do CTN, é indelegável. Ao delegá-la, o poder legislativo agride o princípio da separação dos poderes, o jogo de freios e contrapesos que harmoniza os poderes do Estado se desequilibra. A consequência disso é mais complexidade, a adoção de medidas discricionárias e injustas e o aumento dos litígios tributários. Atílio Dengo. Advogado, Professor e Doutor em Direito Tributário.